Lidar com conceitos abstratos constitui-se num dos grandes obstáculos enfrentados tanto pelos alunos como pelos professores de ciências. No caso específico de conteúdos como Bioquímica e Biologia Molecular, o caráter microscópico e extremamente abstrato de seus conceitos tem sido utilizado por professores do ensino médio como justificativa para evitar esses assuntos, ou tratá-los de forma superficial e centrada na memorização de estruturas, de modo a evitar maiores problemas de aprendizagem para os alunos. Este tipo de solução não é compartilhada pelos membros de nosso grupo, que adotam como hipótese alternativa para a origem deste problema a falta de domínio do conteúdo, o desconhecimento de metodologias que possibilitem um trabalho com conceitos abstratos, além de falta de preocupação em contextualizar esses conteúdos. Assim, este trabalho teve como objetivo verificar a compreensão de conceitos relevantes para o desenvolvimento de uma visão atômica e molecular de Bioquímica e Radioatividade, por parte de professores de Biologia do Ensino Médio da Rede Pública do Estado de Pernambuco. Foram utilizados dois questionários, cuja análise demonstrou altos níveis de dificuldade de compreensão dos conceitos. Dessa forma, no questionário que tratava dos conteúdos de Bioquímica, com relação à dificuldade de compreensão de características e funções dos lipídeos, carboidratos e proteínas, esses níveis chegaram a 96,8% e 77,4%, 95,2% e 96,0% e 79,0% e 85,5%, respectivamente. Com relação às características e funções dos ácidos nucleicos, apesar deste assunto ser a base molecular das novas tecnologias de clonagem e transgênicos, amplamente abordadas pela mídia, observa-se que os níveis de dificuldade de compreensão dos professores impede uma discussão sobre as tecnologias citadas (77,0% e 66,1%). Quanto à capacidade de contextualização da Bioquímica, através de fenômenos do cotidiano que podem ser por ela explicados, observa-se também uma dificuldade que chega a atingir 79,0%. Com relação à Radioatividade, seus possíveis efeitos biológicos, suas aplicações em terapia e diagnóstico e seus riscos, verificou-se que 36% desconhecem o efeito mutagênico das radiações ionizantes sobre as moléculas de DNA; 50% desconhecem a utilização de elementos radioativos em diagnóstico e tratamento de neoplasias; apenas 27% têm conhecimento da presença natural de elementos radioativos no corpo e somente 41%, admitem ser maior o efeito da radiação sobre células com maior taxa de proliferação. Quanto às repercussões de alterações moleculares no organismo como um todo, 70% referem não haver conseqüências em nível macroscópico, demonstrando uma desconexão entre as visões microscópica e macroscópica do funcionamento do corpo humano. Ao serem questionados sobre o que poderia melhorar sua prática profissional, 50% dos professores indicaram a Bioquímica como área de maior deficiência em sua formação, seguida por Genética (33,3%) e Citologia (16,7%). A preocupação de obter treinamento em práticas de laboratório foi referida por 31,1% do grupo entrevistado. Entretanto, apenas 1,6% afirmaram que estas atividades deveriam estar relacionadas ao cotidiano. Estes resultados estão de acordo com nossa hipótese, evidenciando a necessidade de rever a formação dos professores, que não se apresenta satisfatória nas questões ligadas especificamente ao conteúdo, nem nas questões pedagógicas. A adoção generalizada de metodologias centradas na transmissão de conteúdos, sem uso de engenharias didáticas que enfatizem a contextualização do conhecimento, deixa o professor do ensino médio com a tarefa de resolver sozinho suas deficiências em termos conceituais e metodológicos, o que deveria ser trabalhado durante sua formação inicial. A mediação entre o abstrato e o concreto é tarefa essencial de todos os professores.