O LIVRO DIDÁTICO PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS. SELECIONÁ-LOS: UMA DESAFIO PARA OS PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL



Isauro Beltrán Nuñez
isaurob@uol.com.br

Betânia Leite Ramalho
bramalho@hotmail.com

Ilka Karine Pinheiro da Silva
Bolsista CNPq- PIBIC
ilkanildo@bol.com.br

Ana Paula Nogueira Campos
Bolsista CNPq- PIBIC
fantasminha.pluft@bol.com.br
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Programa de Pós-Graduação em Educação



Resumo

    O trabalho discute a sistemática da seleção de livros didáticos para o Ensino de Ciências no Ensino Fundamental. Defende o envolvimento do professorado nessa sistemática de forma consciente assumindo uma postura profissional que privilegie a perspectiva de aprendizagem dos aluno(as) Nesse sentido, os/as professores(as)devem ter um domínio de saberes a serem mobilizados para assumir a responsabilidade ética de saber selecionar os livros didáticos ademais de estarem capacitados para avaliar as possibilidades e limitações dos livros recomendados pelo MEC. O estudo objetiva validar uma guia de análises dos citados livros pelo(a) professor(a). Metodologicamente privilegia-se a análise dos relatórios dos trabalhos desenvolvidos pelos(as) professores(as) em serviço para tal fim durante três períodos diferentes, envolvendo um total de 230 professores(as) alunos(as) em formação do Curso de Licenciatura em Pedagogia da UFRN e 154 livros didáticos.
 


Abstract

    The work discusses the systematic of textbooks’s selection for Sciences’s Teaching in Fundamental Teaching. It defends the faculty's involvement in that systematic in a conscious way assuming a professional posture that privileges the perspective of student's learning. In that sense, the teachers should have a domain of know yourself that will be mobilized to assume the ethical responsibility of knowing to select the textbooks besides they be qualified to evaluate the possibilities and limitations of books recommended by MEC. The study aims at to validate a guide of analyses about mentioned books from teacher. In methodology terms, analysis of works’s reports is privileged developed by teachers in service for such end during three different periods, involving a total of 230 teachers/students in formation of the Course of Degree in Pedagogy of UFRN and 154 textbooks.
 

"Oh! Bendito o que semeia
Livros... livros à mão-cheia...
E manda o povo pensar!
O livro caindo n'alma
É germen - que faz a palma,
É chuva - que faz o mar."

Castro Alves
    Introdução

    A preocupação com os livros didáticos em nível oficial, no Brasil, se inicia com a Legislação do Livro Didático, criada em 1938 pelo Decreto-Lei 1006 (Franco,1992). Nesse período já o livro era considerado uma ferramenta da educação política e ideológica, sendo caracterizado o Estado como censor no uso desse material didático. Os professores faziam as escolhas dos livros a partir de uma lista pré-determinada na base dessa regulamentação legal. Art. 208, Inciso VII da Constituição Federal do Brasil, em que fica definido que o Livro Didático e o Dicionário da Língua Portuguesa são um direito constitucional do educando brasileiro.

    O mecanismo jurídico que regulamenta legalmente a questão do livro didático é o decreto 91 54/85 que implementou o Programa Nacional do Livro Didático, o qual, no seu artigo 2o estabelece a avaliação rotineira dos mesmos. Recentemente a Resolução/ CD/FNDE nº 603, de 21 de Fevereiro de 2001, passou a ser o mecanismo que organiza e regula o Plano Nacional sobre o Livro Didático. O MEC criou várias comissões para a avaliação dos livros didáticos, na busca de uma melhor qualidade, não obstante, esse processo ao longo dos anos tem sido lento, confrontando por vezes, a interesses editoriais que nada têm a ver com as novas orientações para se trabalhar o Ensino de Ciências. A este fato acresce-se a limitada preparação dos professores para participar nos processos de seleção dos livros, tarefa esta bastante exigente para um coletivo que pouco tem recebido em termos de saberes, competências, habilidades, para tal fim, a partir de seus saberes como profissionais.

    Os anos 90 têm assistido a uma veemente e louvável discussão crítica sobre o Ensino Fundamental no Brasil, dentre do que se destaca, a discussão sobre os livros didáticos para esse nível de escolaridade. Soares (2001). A Reforma Curricular nos primeiros ciclos do Ensino Fundamental exige que os novos livros didáticos se correspondam com as atuais exigências de uma Educação no século XXI, no qual o conhecimento, os valores, as capacidades de resolver problemas, aprender a aprender, assim como a "alfabetização científica e tecnológica" são elementos essenciais. Nessa atual perspectiva, o livro didático não pode continuar como fonte de conhecimentos (por vezes equivocados) a serem transmitidos pelo professor a fim de serem memorizados e repetidos pelos alunos. O livro didático, longe de ser uma única referência de acesso ao conteúdo disciplinar da escola, tem que ser uma "fonte viva de sabedoria", capaz de orientar os processos do desenvolvimento da personalidade integral das crianças.

    Embora se observe uma melhor qualidade nos últimos livros recomendados pelo MEC para o ensino de Ciências, a seleção destes é uma tarefa dos professores como profissionais. Essa tarefa não pode ser limitada a um grupo de especialistas responsáveis por analisar os livros e recomendá-los aos professores. Esta tem sido uma prática constante não obstante, seja divulgada nos meios oficiais de comunicação (jornais, rádios, tvs), um chamamento ao professorado para assumir essa tarefa, o tipo de participação docente nesta política pouco tem sido estimulada. Questões tipo: que critérios de escolha são tomados como referência? De onde surgem? Refletem que necessidades, particularidades, interesses? Foram os(as) professores(as) envolvidos(as) na elaboração dos(das) mesmos(as)? Estão os(as) professores(as) em condições de colaborar como profissionais que tomam decisões argumentadas em saberes da área das didáticos- pedagógicas e norteadas pelo conhecimento que as pesquisas tem gerado a esse respeito? Então os processos formativos do professorado preparando-os para tal tarefa?

    Como é preconizado nos principais objetivos do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) se faz necessária a participação ativa e democrática do professor no processo de seleção dos mesmos. Essa situação exige do professor(a) possuir determinados saberes, critérios, competências, etc. para poder realizar em conjunto uma escolha com seus colegas de trabalho.

    É o professor quem deve ter uma boa preparação para desenvolver essa atividade de vital importância. Embora o desenvolvimento das novas tecnologias, da mídia, dos textos digitais, numa Região como a Nordeste do Brasil, o livro didático continua sendo o mais fiel aliado do professor e um recurso imprescindível para os alunos.

    As diversas pesquisas sobre o livro didático no ensino fundamental no Brasil, como em outros países (Gayan e García, 1997), têm mostrado como o livro passou a ser o principal controlador do currículo. Os professores(as) utilizam o livro como o instrumento principal que orienta o conteúdo a ser administrado, a seqüência desses conteúdos, as atividades de aprendizagem e avaliação para o ensino das Ciências. O uso do livro didático pelo(a) professor(a) como material didático, ao lado do currículo, dos programas e outros materiais, instituem-se historicamente como um dos instrumentos para o ensino e aprendizagem. Como argumenta Soares (2001): o livro didático nasce com a própria escola, e está presente ao longo da história, em todas as sociedades, em todos os tempos. San José, L. et al (1993) mostram como os livros didáticos no ensino de Ciências têm um papel central e como cresce o número de estudos relativos ao aperfeiçoamento dos livros didáticos.

    Otero (1990) e Alexander e Kulikowich (1994), assinalam o livro didático como a ferramenta mais utilizada no ensino-aprendizagem. Essa afirmação, para o caso do Brasil, é corroborada por Oliveira, et. al. (1990) e Freitag et. al. (1989).

    A seleção dos livros didáticos para o Ensino de Ciências constitui uma responsabilidade de natureza social e política. Nesse processo os professores estão ou não valorizando o dinheiro do salário-educação, imposto relativo à compra de livros pelo MEC, estão tomando decisões que podem comprometer a educação das crianças.

    Por outro lado, a quantidade de livros didáticos que circulam no mercado, faz da seleção dos mesmos uma tarefa ainda mais complexa e exigente profissionalmente. Como explica Paula: "ocorreu uma acentuada profissionalização na industrial editorial e um enorme crescimento na produção de livros didáticos que, na verdade se relaciona com o aumento de seu mercado consumido". (2001; p.1) num contexto em que as políticas educacionais no Brasil estão orientadas à massificação do ensino fundamental e a busca de qualidade e escolaridade para esse quantidade, fazendo crescer de forma significativa o número de crianças na escola pública e nesse quadro de mudanças, de reformas e de implantação de uma nova LDB (implantada a partir de 1996), que a questão do livro didático para o ensino de Ciências no Ensino Fundamental se complexifica.


A seleção dos livros didáticos para o ensino de Ciências e a Formação do Professor

    Nos livros didáticos para o ensino de Ciências os autores expressam um ou outro tipo de estratégia para as crianças aprenderem o mundo no qual vivem, utilizando as "ciências naturais" como referência na familiarização, explicação, compreensão na realidade. O livro se constitui no representante da comunidade científica no contexto escolar. É nele que as ciências devem dialogar com outros tipos de saberes, como uma obra aberta, problematizadora da realidade, que dialoga com a razão para o pensamento criativo. Nele a Ciência se deve apresentar como uma referência fruto da construção humana, sócio-historicamente constextualizada, na dinâmica do processo que lhe caracteriza como construção, e não como um produto fechado, como racionalidade objetiva única que mutila o pensamento das crianças. O livro didático é produzido para uma criança genérica, que não existe. Isso exige do professor no momento da seleção do livro, pensar nos alunos reais, nas necessidades e possibilidades que lhe são características, o contexto real de vida dos alunos.

    A seleção dos livros didáticos a serem utilizados constitui uma tarefa de importância vital para uma boa aprendizagem dos alunos. Por isso, a importância de procurar critérios específicos para os contextos dados, que possibilitem ao professor participar na avaliação dos livros didáticos. Os critérios estabelecidos, são gerados em diferentes instâncias de análises, das quais os professores, como coletivos, representam a instância que deve tomar as decisões mais apropriadas pensando no alunado com as quais trabalham. A seleção dos livros didáticos não deve excluir os professores como construtores ativos de saberes que desenvolvem essa importante competência profissional (Ramalho, Nuñez e Gauthier, 2000). Os professores devem ter um domínio de saberes diversos a serem mobilizados para assumir a responsabilidade ética de saber selecionar os livros didáticos, e não só isso, como também, estar capacitados para avaliar as possibilidades e limitações dos livros recomendados pelo MEC, pois o livro deve ser um, dentre outras ferramentas para o ensino de Ciências.
 
    O professor deve desenvolver saberes e ter competências para superar as limitações próprias dos livros, que por seu caráter genérico, por vezes, não podem contextualizar os saberes como não podem ter exercícios específicos para atender as problemáticas locais. É tarefa dos professores complementar ", adaptar, dar maior sentido aos bons livros recomendados pelo MEC.

    Face a essa realidade é necessário consolidar pesquisas que, como referências, possam contribuir com o trabalho do professor na hora de selecionar o livro didático. Sob essa intencionalidade nosso grupo de pesquisa, no contexto do Projeto: Estudo, Caracterização e Constituição de Novas Práticas Formativas para a Formação e Profissionalização do Ensino Fundamental (Ramalho e Nuñez, 2000), procurou-se validar uma "guia de análises dos livros didáticos" para o ensino de Ciências. O estudo foi desenvolvido durante três anos, envolvendo 06 turmas de professores em serviço que estudam no Curso de Licenciatura em Pedagogia, na disciplina: "Metodologia do Ensino das Ciências Naturais." A intencionalidade da pesquisa é oferecer aos professores uma referência a mais, na hora de selecionar os livros e não a de disponibilizar uma "receita" para esse importante processo.
 

Objetivos da Pesquisa

    Como objetivos do estudo, foram definidos os seguintes:


O contexto empírico da pesquisa

    O estudo de "validação" da guia de análise dos livros didáticos" para o ensino de ciências nos primeiros ciclos do Ensino Fundamental, foi desenvolvido durante três anos com professores em serviço que cursam a Licenciatura em Pedagogia, no marco dos Convênios da Universidade Federal do Rio Grande do Norte com as Redes Municipais do Estado. Este convênio volta-se para profissionalizar em nível universitário os professores(a) do Ensino Fundamental da Região. O trabalho realizou-se em três municípios do interior do Estado do Rio Grande do Norte: Ceará- Mirim, Touros e Macau.

Distribuição dos(as) professores(as) alvo do estudo

ANO
QUANTIDADE DE PROFESSORES/ ALUNOS
MUNICÍPIO
2000 (1)
77 
CEARÁ- MIRIM
2000 (2)
82 
TOUROS
2001 (1)
93 
MACAU

    Alguns dados caracterizam, inicialmente os sujeitos do estudo:

    Do total dos professores(a) , 85% são do sexo feminino. Prevalece um tempo de trabalho como professores(a) polivalentes entre 5 e 10 anos. Os 90% dos polivalentes são formados(a) no Magistério em nível de Ensino Médio e todos as realizam seu trabalho nos municípios do interior do Estado.


Metodologia da Pesquisa

    O estudo foi desenvolvido durante três anos. Para a análise dos livros didáticos, como uma das atividades na disciplina Metodologia do Ensino de Ciências, foi preparada pelos pesquisadores um "guia ou protocolo" que procurava levantar itens julgados necessários na seleção dos livros, segundo fundamentos da Didática das Ciências, apoiada na perspectiva da aprendizagem como construção do conhecimento. Algumas perguntas chaves da guia de análise foram:

- quais são as bases epistemológicas da aprendizagem?

O guia utilizado nos dois primeiros anos da pesquisa se apresenta no anexo I. - No primeiro ano da pesquisa, os(as) alunos(as)/professores(as), 02 turmas do Município de Ceará Mirim, totalizando 80 alunos/professores, desenvolveram o trabalho segundo os seguintes momentos:     A partir dos resultados (relatório dos grupos) e da análise feita pelos pesquisadores dos textos utilizados pelos alunos(as), foi possível estabelecer graus de correspondência entre as respostas dos grupos e dos pesquisadores a fim de inferir limitações da "guia de análises", assim como suas potencialidades. Foi possível também analisar a preparação dos(as) alunos(as)/professores(as) para desenvolver a atividade.

- No segundo ano da pesquisa, o procedimento foi repetido com alunos/professores de outro município (Touros), duas turmas de 40 alunos cada uma.

- No terceiro ano, o "guia de análises" foi reformulado (anexo II) a fim de facilitar a compreensão dos itens e uma melhor orientação para as análises dos livros didáticos. O estudo dessa vez foi desenvolvido no mesmo tipo de curso, segundo o mesmo procedimento metodológico, mas no município de Touros, com duas turmas de 40 alunos cada uma.

    Ao final do processo de coleta e analise dos dados foram desenvolvidas tabelas com as respostas aos itens do "guia de análises" para cada ano do estudo.

    A análise do conteúdo (categorização das respostas) e a quantificação de resposta por categoria foram privilegiados como recursos de processamento da informação.
 

Resultados

    Nos anos nos quais foi desenvolvida a pesquisa, foram analisados pelos professores um total de 154 livros didáticos para o Ensino de Ciências. Os livros analisados segundo os critérios de avaliação do MEC se correspondem com as seguintes denominações.

Referências sobre os livros analisados

ANO DA PESQUISA Total de 

livros 

analisados 
 
 

Quantidade de 

livros repetidos

QUANTIDADE DE LIVROS POR CATEGORIAS
Recomendados com distinção *** Recomendados ** Recomendados com ressalvas * Outros
2000 (1) 69

12

- 01 34 22
2000(2) 66

30

01 01 20 14
2001(1) 19

04

04 01 03 07
Total 154

46

05 03 57

43

    A partir dos relatórios do trabalho desenvolvido pelos grupos de análise dos livros didáticos para o ensino de Ciências, podemos significar os resultados mais expressivos, os quais possibilitam refletir sobre a "guia de análises" e o grau de preparação dos professores para a atividade de análise dos livros. Os resultados mais significativos alcançados são os seguintes:

    Foi uma oportunidade para se discutir como o livro pode orientar a contextualização do conhecimento e como é tarefa do professor organizar atividades de aprendizagem nesse sentido considerando os contextos reais das crianças. Um importante argumento foi levantado: a necessidade de se compreender as relações dialéticas entre o singular (o contexto local) e o universal, em relação a problemáticas globais das ciências, as tecnologias, as sociedades. - Dos livros trabalhados pelos(as) professores(as), pode resumir-se, na seguinte tabela, os tipos de aprendizagem que caracterizou as unidades desenvolvidas.
 
Tipos de aprendizagem resultantes da análise
ANO
APROPRIAÇÃO FORMAL
ASSIMILAÇÃO
CONSTRUÇÃO
OUTROS
2000 (1)
41
5
10
13
2000 (2)
24
8
19
15
2001 (1)
07
01
08
04

    O modelo de Apropriação Formal se identifica com a aprendizagem "tradicional". O modelo de aprendizagem como "bases teóricas as idéias de J. Piaget e P. Ausubel, enquanto o modelo por "construção" assume a concepção construtivista como "mudança conceitual" (Pozo, 1996). A categoria "outros" da tabela responde a modelos identificados como "pseudo- construtivismo".

- O item da "guia de análises", no qual os professores, durante os três anos, manifestaram maior fragilidade, é o item no qual deviam analisar os erros conceituais e metodológicos presentes nos livros didáticos. Os resultados apontam para as limitações dos professores para identificar erros conceituais nos livros didáticos . A reflexão dessa problemática revelou o fato de maior parte dos professores ter estudado o conteúdo das Ciências pelos próprios livros que utilizam com seus alunos, por vezes acompanhadas de uma guia do livro para o professor. Essa situação é resultado, dentre outros fatores, da pouca atenção que os cursos de Pedagogia dão os conteúdos das Ciências, como saberes a serem do domínio dos professores. Shulman( 1986), de forma autocrítica reconhece que os "pedagogos tem estudado todos os fatores que influenciam no ato educativo... a excepção do conteúdo a ensinar." As pesquisas no campo da Didática das Ciências (Tobin e Espinet, 1989) tem mostrado como a principal dificuldade para a investigação no ensino de Ciências o constitui a fragilidade no domínio do conteúdo a ensinar.

    A partir de estudos sobre os erros conceituais nos livros didáticos de Ciências, foi possível revelar alguns desses erros nos livros analisados pelos professores, a fim de romper o "círculo vicioso", de "aprender pelo livro que ensinamos", motivando a busca em outras fontes que possibilitem refletir sobre os conteúdos conceituais nos livros.

    Nos três anos da pesquisa, foi unânime pelos(as) professores(as) a avaliação positiva do trabalho desenvolvido com a "guia de análises dos livros didáticos. Sua participação na pesquisa, como sujeitos ativos, possibilitou questionar um hábito ou rotina baseado na "metodologia da superficialidade", como é o processo de seleção dos livros, feito de forma espontaneísta e com limitadas referências teóricas. Os(as) professores(as) reconheceram a necessidade de aprofundar nos estudos dos conteúdos disciplinares das Ciências, (questão que se revela como um obstáculo para o trabalho de análises dos livros), assim como em referência e pesquisas da Didática das Ciências.


Conclusão

    O professor deve estar preparado não só para selecionar os livros de uma "lista" organizada por "especialistas", como também para saber lidar com os erros presentes nos livros ao alcance de seus alunos. Não todos os livros excluídos pelo MEC deixaram de circular pelas escolas. Muitos deles ainda são parte do acervo bibliográfico das escolas e de uso das crianças. Essa situação mostrou que a questão do livro didático ultrapassa a seleção, para incorporar também a preparação do professor para trabalhar com esse material, capacitado para participar como profissional, com seus saberes, competências, nessa atividade, que não pode ser delegada com exclusividade a um grupo de profissionais monopolizadores de saberes específicos. Aos professores tem que ser dado oportunidade de dominar esses saberes se é desejável que o trabalho com o Livro Didático para Ensinar Ciências se transforme numa atividade profissional do professor.

    A pesquisa possibilitou validar a "guia de análises" dos livros didáticos para o ensino de Ciências como uma referência que pode passar a formar parte da "base de conhecimento" para o trabalho do (a) professor(a) como profissional. Não se propõe uma "receita" para analisar os livros, e sim uma referência a mais dentre outras, para os(as) professores(as) ter referências vindas das pesquisas, nas quais eles participam, e nas quais podem encontrar saberes para a construção/reconstrução de competências profissionais.
 

Bibliografia

ALEXANDER, P. e KULIKOWICH, J. Learning from physics text: syntheses of recent research. Journal of Research in Science Teaching, vol. 31a, 895-911, 1994.

ASTOLFI, J. P. e DEVELAY, M. A Didática das Ciências. Campinas –SP: Papirus. 1995.

AUSUBEL, D. P.; NOVAK, J. D. e HANESIAN, H. Psicologia Cognitiva. México. Trilhas; 1989.

BACHELARD, G. A epistemologia. Rio de Janeiro: Edições 70. 1995

BIZZO, N. M. Graves erros de conceito em livros didáticos de Ciências. Ciência Hoje. 21p. 26-35

CARNEIRO, S. M. H. As imagens no livro didático. In: ATAS do I Encontro Nacional de Pesquisa em Ensino de Ciências. Águas de Lindóia, São Paulo, 1997, p. 366-373.

CHEVALLARD, Y. La transposición didáctica- del saber al saber enseñado. Buenos Aires: Aique. S.d.

DELORS, J. (Org.) Educação: Um tesouro a descobrir. São Paulo: Brasilia: DF. MEC: Cortez: UNESCO. 2000.

DRIVER, R. Un enfoque constructivita para el desarrollo del currículo en ciencias. Enseñanza de las Ciencias. 6 p. 105-120; 1998.

FRANCO, M. L. P. B. O livro didático e o Estado. ANDE, ano I, no 5, 1992, p. 19-24.

FREITAG, B.; COSTA, W. F. da; e MOTTA, V. O livro didático em questão. Cortez: autores associados, São Paulo, 1989.

GALAGOVSKY, L. R. Redes conceptuales: Base teórica e implicaciones para el proceso de enseñanza a aprendizaje de las ciencias. Enseñanza de las Ciencias. 11 (3) p. 301-307; 1993

GARRET, R. M. Resolución de problemas y creatividad: implicaciones para el currículo de ciencias. Enseñanza de las Ciencias. 1998, G (3) p. 224- 230.

GAYÁN, E. e GARCÍA, P. E como escoger un libro de texto? Desarrollo de un instrumento para evaluar los libros de texto de ciencias experimentales. Enseñanza de las ciencias. Número Extra, V Congresso, p. 249-250;1997.

GIORDAM, A. e VECCHI, G. As origens do saber. Porto Alegre. Artes Medicas. 1996.

Livro didático- PNLD. MEC. http: // www.fnde.gov.br/programas/pnded.htm

LOPES, C. R. A. Conhecimento escolar: Ciência e cotidiano. EDUERJ: Rio de Janeiro. 1999

MEC. Resolução/CD/ FNDE. Nº 003 de 21 de fevereiro de 2001. http://fnde.gov.br

MORIN, E. Epistemologia da complexidade. In, Schnitman, D. F. (org.) Novos Paradigmas, cultura e subjetividade. Porto Alegre: Artes Médicas. 1996 p. 274-286.

NUÑEZ, B. I. e FRANCO, S. O ensino por problemas. Categorias e Métodos. Material mimeo, Natal, 2001.

OGBORN, J.; KRESS, G.; MARTINS, I. e MCGEKICUDDY, K. Explaining Science. G. B.: The Open University Press, 1996.

OLIVEIRA, J. B.; GUIMARÃES, S. D. P. e BOMENY, H. M. B. A política do livro didático. Summus, 2a edição, Campinas, São Paulo, 1984.

ORTORIA, A. (Org.) Mapas conceituais. Uma técnica para aprender. Edições ASA. Lisboa. 1994

OTERO, J. Variables cognitivas y metacognitivas en la comprensión de textos científicos: el papel de los esquemas y el papel de la propia comprensión. Enseñanza de las Ciencias, vol. 8 (1, p.17-22), 1990.

PAULA, R. A política de seleção e distribuição dos livros didáticos de História no Estado de São Paulo. http:/ www.anped.org.br/0505p.htm

POZO, J. I. (Org.) A solução de problemas. Aprender a resolver, resolver para aprender. Artes Medicas. Porto Alegre: 1998 (b).

POZO, J. I. Teorias Cognitivas da Aprendizagem. Artes Medicas. Porto Alegre, 1998

POZO, J. I.; GOMES, C. M. e LIMON, M. Las ideas de los alumnos sobre la ciencia: una interpretación desde la psicología cognitiva. Enseñanza de las Ciencia. 7 p. 18-26. 1996.

REVISTA NOVA ESCOLA, Os livros didáticos; agosto, 1994, p. 24-27.

SAN JOSÉ, V. et al. Mejorando la efectividad instrucional del texto educativo en ciencias: primeros resultados. Enseñanza de las ciencias, 11 (2, p. 137-148), 1993.

SERAFINE, G. As inquietações do Sr. K. sobre o rigorismo dos conteúdos escolares. IN: WEISSMAN, H. (Org.) Didática das Ciências naturais: contribuições e reflexões: ArtMed. Porto Alegre, 1998; p.91-126

SHULMAN, L. (1986) Those who understand: the knowledge growths in teaching. Education Researcher. Fev. p.4-14

SOARES, M. B. Livro didático: Uma história mal contada. Fazendo Escola. Editora Moderna. http: // www.moderna.com.br/escola/professor/arto2

TFOUNI, L. V. et al. A teoria de Piaget e os exercícios dos livros didáticos de Química. Química Nova. 10 (2) 1987 p. 127-132.
 
 

ANEXO I

Guia para análise dos livros didáticos-Períodos 2000 (1) – 2000 (2):

1. Os conceitos aparecem como conseqüência de uma atividade de familiarização perceptível e macroscópica, de forma declarativa e processual e não processual, ou como uma atividade de construção de novos significados.

2. Os conceitos se definem a partir de outros conceitos com os quais os alunos não têm trabalhado ao nível de internalização, como conceitos científicos. Considera a aura conceitual.

3. No texto, se trabalham as idéias vinculadas aos conceitos com caráter sistêmico, de forma a facilitar sua compreensão e passa uma visão mais própria da realidade. 


4. Se aproveitam os aspectos históricos como componentes do processo de construção do conhecimento científico, revelando seu caráter social, político, histórico, contextualizado ou se faz uma breve referência a um cientista ligado a um descobrimento.

5. Aparecem exercícios para aplicar de forma produtiva os conceitos vinculados as situações problemáticas e as possíveis idéias prévias dos alunos, que possibilita a aprendizagem significativa.

6. Os conteúdos são socialmente contextualizados, orientados a contribuir a desenvolver nos alunos a critica-reflexiva.

7. Tipos de erros conceituais e metodológicos mais freqüentes que constituem verdadeiros obstáculos epistemológicos para a assimilação do conteúdo.

8. Tipo de organização que caracteriza o trabalho dos conteúdos.

9. Tipo de aprendizagem que caracteriza o tratamento dos conteúdos.

10.Abre-se espaço ao trabalho do contexto do aluno.

11.Como estratégia se trabalha uma ligação entre os diferentes conteúdos da disciplina com outras disciplinas.

12.As ilustrações se correspondem com os objetos de estudo, ou são exemplos que obstaculizam a compreensão do conteúdo.

ANEXO II

Guia para análise dos livros didáticos-Ano 2001 (1) :

1) Se faz uma atividade de motivação para o estudo do tema
2) São dadas atividades no início do tema estudado para que os alunos explicitem suas idéias prévias.
3) Os conceitos aparecem como conseqüência de:
a) uma atividade de familiarização perceptível, macroscópica, de forma declarativa e não processual.
b) Construção de novos significados.
    4) Os conceitos se definem a partir de outros conceitos com os quais as alunos não têm trabalhado ao nível de internalização, como conceitos científicos..
    5) Considera a aura conceitual.
    6) São dadas atividades que possam trabalhar as atitudes.
    7) São dadas atividades de procura, de intercâmbio e comunicação de informações.
    8)São dados trabalhos de natureza prática e situações problemas.
    9) São dadas atividades para trabalho interdisciplinar.
    10) Existem atividades que procuram prestar atenção à diversidade.
    11) Aproveitam-se os aspectos históricos como componente do processo de construção do conhecimento científico, revelando seu caráter social, político, histórico, contextualizado ou se faz uma breve referência a um cientista ligado a um descobrimento.
    12) Tipos de exercícios:
a) Para aplicar de forma produtiva os conceitos, vinculados a situações problemáticas e as possíveis idéias prévias dos alunos, que possibilita a aprendizagem significativa.
b)Para a fixação dos conteúdos a) As ilustrações se correspondem com os objetos de estudo, ou são exemplos que obstaculizam a compreensão do conteúdo.
b) Os conhecimentos são tratados como modelos ou como realidade objetiva.
15) Tipo de organização que caracteriza o tratamento dos conteúdos.
16) Tipo de aprendizagem que orienta o trabalho com o livro didático.
17) Complexidade dos textos.
18) Pertinência das informações.
19) Atualidade dos textos em relação a ciência hoje e seus problemas