MUDANÇA DO CLIMA EM LIVROS DIDÁTICOS DE BIOLOGIA



Márcia Cristina Espiñeira Dias
 

Resumo

    O trabalho apresenta a análise do conteúdo mudança do clima presente em livros didáticos de Biologia para o Ensino Médio, no Rio de Janeiro. Analisamos quatro livros quanto à forma como apresentam o assunto. O tema é relevante pois, iniciativas como esta pesquisa são fundamentais para a difusão e aprendizado adequado deste conteúdo científico.


Abstract

    This research presents the analysis of textbooks used by students in high school in Rio de Janeiro. We have analysed four textbooks the way the theme is demostrated. This subject is relevant because of the trainning, dissemination and public conscience on knowledge on climate change are fundamental for the adequated learning in this scientific contents.
 

Introdução

    Dentre as diversas atividades desenvolvidas no Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais (IVIG) – Coppe/UFRJ, estão sendo realizadas iniciativas relacionadas à educação e mudança do clima. Este trabalho de analise de livros didáticos de Biologia para o ensino médio, se encaixa neste contexto, sendo considerado de relevância, pois de acordo com o artigo seis da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (CQNUMC), que trata de educação, treinamento e consciência pública para disseminar o conhecimento sobre mudança do clima, propor iniciativas que tornem a difusão desse conhecimento abrangente e adequada são fundamentais.

    Deve-se ter em mente também que trabalhos deste tipo podem contribuir para o desenvolvimento de analises e critérios julgamento e avaliação próprios dos docentes que trabalharão o assunto em sala de aula. Bem como ampliar a visão do assunto para melhor ensiná-lo.

    A atualidade do tema, as questões políticas que o colocam no bojo de uma discussão mundial sobre caminhos da qualidade de vida no planeta, provocam a busca de subsídios básicos de conhecimento que esclareçam o problema do efeito estufa.

    Como a configuração deste conhecimento é relativamente recente, apresentam-se alguns breves esclarecimentos sobre Mudança do Clima. Na seqüência do trabalho, propõe-se alguns critérios que foram elaborados, com a finalidade de analisar o tema, a forma como está apresentado e está veiculado nos livros didáticos. Procurou-se identificar as unidades e os capítulos dedicados especialmente ao assunto. Os livros analisados foram Lopes (1999), Paulino (2000), Favaretto e Mercadante (1999) e Fonseca (2000).

    Neste trabalho optou-se por organizar os dados a partir dos livros didáticos, apresentando os critérios de análise de cada um em separado.


Esclarecimentos sobre Mudança do Clima

    Ao analisar as diferentes formas com que a sociedade humana se relaciona com o meio físico-natural através dos tempos, constata-se, em realidade, a questão ambiental. Em nenhum momento da história, a humanidade viveu sem o auxílio do meio físico-natural, sempre dependendo dele para garantir sua sobrevivência. Portanto, o seu uso e as alterações decorrentes deste uso, são tão antigos quanto a própria presença do homem na Terra.

    Ao focalizar-se a mudança clima, de acordo com o Painel Intergovernamental de Mudança do Clima (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU), as alterações na atmosfera causarão profundas mudanças no planeta neste século, de acordo com as estimativas alarmantes que vêm sendo apresentadas. Ao apontar a mudança clima, como um paradigma[1] determinante na qualidade do meio ambiente, esta vai ocupando espaço dentre os grandes problemas da ciência em relação a vida no planeta neste início de século.

    Enquanto os mares, os rios, as florestas e a atmosfera não necessitam da ação humana para existir, o meio ambiente, fruto da relação dos seres humanos entre si e com o meio físico natural, necessita do trabalho destes últimos para ser construído e reconstruído, ou seja, para ter existência concreta.

    Dessa forma, pode-se dizer que meio natural e meio social são indissociáveis. E como o ser humano é parte integrante da natureza e ao mesmo tempo ser social, detentor de conhecimentos e valores, tem o poder de atuar permanentemente sobre o meio natural alterando suas propriedades, e sobre o meio social provocando modificações em sua dinâmica. No processo de transformação do meio ambiente através da ação coletiva dos seres humanos, seja com resultados positivos ou negativos, são desenvolvidas várias formas de relacionamento do homem com a natureza e dele com a própria sociedade. A mudança do clima vem caracterizando-se como um conhecimento muito importante dentro da questão ambiental.

    De acordo com o IPCC, a respeito da emissão de CO2, ou dióxido de carbono na atmosfera, a partir de queima de petróleo, carvão mineral e gás, além das queimadas e incêndios florestais; a previsão é de que neste século a temperatura média global eleve-se em torno de 1,5ºC a 4,5ºC, com a possibilidade de o nível do mar subir, causando, entre outras coisas, inundação de várias áreas litorâneas. A natureza não consegue metabolizar, através de florestas e oceanos, esta massa de gás que impede então a dispersão de calor causado pelos raios do sol que atingem a Terra, ou seja, ocorre o efeito estuda.

    Para uma expressiva parcela da comunidade científica, o agravamento dos cataclismos ambientais (nevascas, enchentes, furacões, secas, ventanias) que vêm causando transtornos pelo mundo é atribuído ao efeito estufa[2].

    Em termos históricos, existem registros desde 1750, de que a concentração atmosférica de carbono aumentou 31%, saindo de 280 partes por milhão (ppm) para 367. De acordo com levantamentos realizados em colunas de gelo, nos quais se analisa a composição histórica de gases atmosféricos, não há registros de concentração igual à atual pelo menos nos últimos 420 mil anos. Além disso, observa-se uma diminuição nas emissões de dióxido de enxofre, um gás que poderia compensar parte do efeito estufa, resfriando a atmosfera.

    De acordo com Santos (1999), é fato que houve um aumento significativo, no último século, da concentração atmosférica de gases acusadores do efeito estufa. Entretanto, isso não é um evento novo na história terrestre. Em eras geológicas remotas, como entre 255 milhões e 50 milhões de anos atrás, a atmosfera foi mais rica em gás carbônico, o que permitiu a existência de uma flora muito mais rica e abundante, bem como a formação de grandes depósitos de carbono fóssil (petróleo e carvão). A redução progressiva desse gás carbônico, pela própria atividade fotossintética, teria motivado o desaparecimento daqueles ecossistemas primitivos, dominados por samambaias gigantes.

    Fica-se então com uma previsão de possíveis alterações futuras na atmosfera que irão depender, fundamentalmente, das atitudes tomadas no presente. Daí pode-se justificar a importância da analise da forma como o conhecimento sobre mudança do clima vem sendo difundido.


Critérios de análise

    Os critérios[3] propostos de análise buscaram revelar como o conteúdo mudança do clima é tratado nos livros didáticos. Foi feita uma organização de modo a constituir uma ficha (figura 1) que expressou o resumo esquemático da análise de cada livro.

Figura 1: Análise dos livros didáticos

Referência:

CRITÉRIOS AVALIAÇÃO
Apresentação  
Conceito/definição  
Explicação/forma  
Ilustração  
Previsões/ações recomendadas  
Enfoque ambiental  
Atividades propostas  

    Os critérios elaborados tiveram alguma orientação com base nos propostos por Mohr (2000), as respectivas avaliações possíveis estão a seguir:

    Na APRESENTAÇÃO procurou-se identificar, principalmente, em que contexto o assunto é apresentado, em que parte do livro aparece. Assim tentou-se evidenciar como o tema é representado; como um tópico da Biologia, com relação a qualidade de vida do planeta, ou como um tópico da ecologia etc.

    Para cada conteúdo apresentado no livro didático identificou-se a presença ou ausência de CONCEITO ou DEFINIÇÃO. Utilizou-se uma significação abrangente de conceito, sendo a idéia ou noção geral acerca de algo. No livro didático quando se fala de conceituação, esta deve apresentar informações e explicações que proporcionem ao aluno a compreensão geral, mesmo que não muito precisa, sobre o assunto em questão. Já a definição deve abordar o tema de maneira formal e precisa. De acordo com Mohr, a presença da definição não é condição sine qua nom para a conceituação; o que geralmente não é verdadeiro para a situação inversa: nem sempre se pode compreender uma definição sem a conceituação.

    No item EXPLICAÇÃO e FORMA, é imprescindível que o assunto seja bem explicado, apresentando texto em linguagem adequada à faixa etária do ensino médio. Logo, é fundamental observar-se a explicação e a forma como esta é conduzida para expor o tema. Quando abordamos a forma, estamos nos referindo a como o assunto é tratado, se há conceitos desconexos, ou existe uma relação entre as explicações sugeridas para o tema como um todo. Devemos examinar também a correção científica, onde avaliamos a propriedade e atualidade dos textos conceitos e definições.

    Em relação à ILUSTRAÇÃO, sabe-se que observar sua qualidade, correção e adequada inserção no texto são fatores relevantes para a compreensão dos conteúdos apresentados sobre o tema deste estudo.

    Quando se inseriu observar PREVISÕES e AÇÕES RECOMENDADAS, tentou-se evidenciar previsões que são uma característica do estudo da mudança do clima, como visto anteriormente, existe uma previsão de aumento da temperatura da terra nos próximos 100 anos, então se buscou alguma informação sobre este dado estar presente nos livros. Quanto às ações recomendadas, pode-se levar em conta tanto os comportamentos individuais, como aquele de caráter coletivo, no caso do assunto em questão, é importante notar se existe uma provocação para a promoção de consciência do que as medidas preventivas possíveis representam para a vida futura da Terra.

    Considera-se que a mudança do clima é um processo que acontece no ambiente, apontando para a grande importância que tem o ENFOQUE AMBIENTAL, inserindo a ação antrópica, que neste caso parece ser fundamental para se compreender o tema.

    Para finalizar, é desejável que as ATIVIDADES PROPOSTAS contemplem a aquisição de conhecimentos, a capacidade de análise, de crítica e estimulem a iniciativa dos alunos. Tentou-se explicitar também se as atividades incentivavam a formação de opinião por parte dos alunos, assim como estimulavam a busca de conhecimentos para além do livro didático.


Análise dos livros didáticos através dos critérios propostos

    O tema efeito estufa é apresentado sob a forma de um pequeno texto, como assunto para reflexão que a autora do livro recomenda aos docentes: conhecimentos de ecologia são fundamentais para a formação de cidadãos cada vez mais conscientes (p.545) relacionando-o ao equilíbrio dos ecossistemas e apontando-o como de interesse dos alunos. Assim como atribuindo responsabilidades a atividade humana: danos que o ser humano pode causar ao ambiente (p.545). A autora, também aponta para a importância de veicularmos informações sobre as possibilidades de recuperação e preservação da natureza que nos cerca. O texto aparece como um apêndice no Capítulo 35 – Introdução à Ecologia e Estrutura dos Ecossistemas (p.538 a 550), que pertence à Unidade 7 – Ecologia. Já, no Capítulo 38 - (p. 577-586 ), o termo efeito estufa é citado como tema comentado no Capítulo 35, quando a poluição do ar é abordada.

    O conceito de efeito estufa é apresentado nas primeiras linhas do texto, retratando a analogia com uma estufa, que também está presente na ilustração. Existe uma breve citação dos gases que contribuem para o efeito estufa (gás carbônico, vapor d’água, metano e óxido nitroso). Porém não foi identificada uma definição do tema no texto.

    Para explicar o efeito estufa, o texto recorre à analogia com a estufa. Existe uma referência à atividade humana como agravante para o aumento do fenômeno e uma ênfase no CO2 como principal fator de incremento ao efeito estufa. Embora breve e pouco abrangente, a explicação tem uma forma razoável que conduz o tema fazendo relações com os fatores, as causas e possíveis conseqüências do problema para a natureza.

    A ilustração (figura 2) não possui legenda e apresenta uma simples analogia com o princípio de funcionamento de uma estufa, para explicar o efeito, de mesmo nome. Não existe uma explicação mais detalhada, graficamente, no desenho de como ocorre o processo. Sua inserção é adequada, porém não é enriquecedora em termos de aquisição de conhecimentos além da explicação existente no texto.

Figura 2: Ilustração do livro Bio – Volume Único

    Dentro das previsões e ações recomendadas, o texto aborda a queima de combustíveis fósseis contribuindo para o aumento do efeito estufa e também nota-se a presença da previsão de catástrofes pelos cientistas devido a este possível aumento de temperatura da Terra. O texto oferece uma breve reflexão, em uma frase sobre atividades humanas, utilização de combustíveis e a busca por fontes de energia com menor impacto sobre o meio ambiente. Não existe nenhuma alusão à média de aumento da temperatura para os próximos 100 anos, dado que está presente na literatura científica sobre o tema, nem tampouco nenhuma proposição para uma tomada de consciência sobre ações preventivas para o futuro.

    Embora o assunto tenha sido apresentado no livro de maneira precária, considera-se que o enfoque ambiental está presente desde a chamada para o texto (p. 545), quando a autora provoca a busca de consciência dos cidadãos, assim como com a ação antrópica, contribuindo para o aumento do efeito estufa. Bem como, ao final do texto, numa demonstração de preocupação com a atividade humana e a necessidade de formas menos impactantes ao ambiente de produção de energia.

    No capítulo em que o texto aparece (Capítulo 35) não foi encontrada nenhuma atividade proposta que abordasse o tema. No Capítulo 38, já citado no critério de analise de apresentação, o aquecimento do globo é colocado (p. 585) numa resposta incorreta de questão objetiva referente à poluição. Numa outra questão, no caso discursiva, o tema é disposto de forma a buscar a definição do fenômeno, assim como a principal causa atribuída pelos cientistas à intensificação do efeito estufa devido às queimadas em florestas que estão citadas no enunciado da questão. Além de haver uma pergunta também sobre possíveis alterações resultantes da intensificação de tal efeito. Esta questão aparece como retirada de um exame de vestibular.

    O tema é apresentado sob a forma de um texto em destaque, num anexo, do Módulo 79 – Ciclos biogeoquímicos (p.352-357), da Parte III – Ecologia. O assunto é tratado como: Efeito estuda – uma ameaça no ar (p.353). Já, no Módulo 87 - Desequilíbrios ambientais (p.388-393), também da Parte III, o autor faz um comentário rápido sobre efeito estufa. Nos dois locais em que aparece no livro, o autor não apresenta maiores esclarecimentos ou interfaces do efeito estufa com outros conhecimentos, muito menos chama a atenção para a interferência das atividades humanas na situação.

    O conceito de efeito estufa é demonstrado por meio de analogia com a estufa, alguns gases envolvidos no fenômeno são citados: O gás carbônico, assim como outros gases, como o metano (CH4), é considerado um "gás estufa" (p.353). Não foi evidenciada no texto nenhuma definição sobre o tema.

    A explicação do efeito estufa é conduzida de forma a apresentar a analogia com a estufa relacionando minuciosamente as condições atmosféricas com cada parte integrante de uma estufa. Não foi encontrada no texto alusão à como ocorre o aumento de gás carbônico na atmosfera, nem tampouco é indicada a participação da atividade humana em tal evento. Porém, no Módulo 87 (p.388) ao tratar de principais formas de poluição, a possível causa do efeito estufa é indicada, mas esta informação está dissociada do texto do Módulo 79. (p.353). As possíveis conseqüências da mudança climática são colocadas pelo autor como possibilidades que alguns cientistas acreditam. Existe uma citação a Svante Arrhenius, o químico sueco, como criador do termo efeito estufa.

    A ilustração (figura 3) representa a concentração de gás carbônico na atmosfera traçando um histórico das emissões de 1958 a 1990. Na legenda, além de explicar a procedência das medições, existe uma informação sobre a elevação de gás carbônico desde a revolução Industrial até 1984. A figura possui legenda, porém, mesmo sendo uma informação interessante, não explica o efeito estufa. Mais esclarecimentos, sobre a ilustração seriam produtivos para justificar sua inserção.

Figura 3: livro Biologia – Volume Único – Série Novo Ensino Médio

    Em relação às previsões e ações recomendadas, não existem nos dois locais em que o assunto aparece no livro nenhuma proposta de ação preventiva. As possíveis conseqüências do efeito estufa são apontadas como especulações que possuem o crédito de alguns pesquisadores: Há quem acredite, por exemplo, que o efeito estufa poderá desencadear...entre outros desequilíbrios (p.353). Nenhum comentário ou proposição de busca de mais informações sobre esta questão está presente.
 
    O livro em questão apresenta o enfoque ambiental desarticulado completamente da ação antrópica, esta não é mencionada. A ênfase apresentada está relacionada somente com os prejuízos possíveis ao meio ambiente devido à elevação da concentração dos gases de efeito estufa, principalmente gás carbônico, sendo tratados como agentes poluidores. Embora apareça em dois módulos da parte referente a ecologia, o enfoque ambiental está restringido a abordagem de possíveis prejuízos ao meio ambiente sem relação com as atividades que poderiam a que se poderia atribuir sua causa.

    Nas atividades propostas, este livro apresenta, no Módulo 79 a mesma questão discursiva que o livro Bio – Volume Único, analisado anteriormente, demonstrando também que esta era uma questão de exame vestibular. Não foi evidenciada nenhuma outra atividade que abordasse o efeito estufa.

    Neste livro, o assunto aparece na Unidade 1 – O Cenário da vida, no Capítulo 6 – Biosfera e ação humana (p.55-81), dentro deste o assunto é situado num tópico: Aquecimento global – evidências e incertezas. Este, por sua vez, é subdividido em: O calor da Terra, O carbono, Aquecimento global e Os vilões do aquecimento. Logo no primeiro parágrafo do Capítulo 6 (p.55), os autores caracterizam a ação antrópica como contribuinte importante para a qualidade de vida do planeta: O que cada habitante da Terra faz ao ambiente reflete em toda a humanidade! O que é tratado de forma articulada, relacionando diversas áreas do conhecimento; como geografia, política e economia que contribuem para uma melhor compreensão do assunto no contexto em que se insere.

    A conceituação do tema é bem conduzida com a introdução de breves definições de termos importante para entender o assunto (tipos de radiações – p. 58). Existem esclarecimentos sobre as diversas origens de gases de efeito estufa, bem como uma breve definição de uma teoria do efeito estufa (p.59).

    A explicação é gradual, crescendo em complexidade com dados fornecidos pelo próprio livro texto.Neste livro a analogia para explicar o efeito estufa é feita com um carro fechado exposto ao calor do sol. Existe a inserção de informações históricas sobre elevação da temperatura da Terra (p.59) e da concentração dos gases de efeito estufa (p.60). A forma de apresentação do tema demonstra condições de levar o aluno a formar sua própria explicação.

    A ilustração (figura 4) não é muito esclarecedora, embora tenha o propósito de demonstrar graficamente o efeito estufa, pode-se notar que a diferença do quadro a para o quadro b não é muito significativa, mas existe uma legenda para a explicar a figura que esclarece a diferença dos quadros a e b. Pode-se dizer que, embora de inserção adequada, a figura não contribui de forma efetiva para o conhecimento do assunto.

Figura 4: livro Biologia – Volume Único – Coleção Base

    Dentre as previsões e ações recomendadas, encontramos no livro uma abordagem mais abrangente do tema como um todo. Existem previsões sobre as conseqüências do efeito estufa não só para o meio ambiente, como também para a vida humana (p.60), tanto em aspectos de integridade física (incidência de doenças) quanto de qualidade de vida (disponibilidade de terras agriculturáveis, fontes de energia etc.). Em termos de ações recomendadas, não existem propostas de ações no livro. Porém, as previsões bem fundamentadas, que são apresentadas, podem provocar uma busca por ações preventivas para o futuro.

    O enfoque ambiental permeia toda a parte do livro que expõe o assunto, tratando não apenas de questões biológicas como apresentando também um enfoque político e econômico como na subdivisão Os vilões do aquecimento: Em 1992, as emissões globais de CO2 foram calculadas em quase sete bilhões de toneladas, provenientes, principalmente, de países industrializados (p.60). Dessa forma o meio ambiente está num contexto de fatos e atividades que interferem em sua preservação.

    Ë interessante observar que este livro apresenta, ao final de cada capítulo uma sessão de reflexão em que os temas tratados são colocados para discussão e tema aqui estudado está presente numa atividade de reflexão que apresenta uma citação de 1996 do World Climate Change Bulletin: Hoje os países ricos queimam a maior parcela dos combustíveis fósseis; no futuro, os países pobres pagarão a maior parcela da conta (p.60). O livro, assim como os outros, também apresenta questões retiradas de exames vestibulares, neste caso a questão é discursiva (p.78) e trata de um histórico do teor atmosférico de CO2 nos úlimos 100 anos. Ao relacionar o enunciado aos fatores que podem explicá-lo, às previsões para a biosfera e ao consumo de energia elétrica, pode-se considerar que a questão faz uma rica trama que pode proporcionar ao aluno uma visão instigante e enriquecedora sobre o efeito estufa.

    O tema é apresentado na Unidade 9 – Ecologia, no Capítulo 50 – Ciclos biogeoquímicos (p. 423-428), onde é abordado num tópico entitulado: Efeito estufa (p.424). Neste tópico existe uma breve explanação do assunto, sem maiores esclarecimentos ou correlações com outras áreas de estudo.

    O conceito é apresentado sob a forma de uma analogia do gás carbônico com os vidros de uma estufa. Pode-se identificar também uma definição para o fenômeno, apresentada de maneira superficial, sem fundamentação dos termos envolvidos no seu enunciado, de forma não contextualizada. O assunto aparece isolado como, simplesmente, mais um tema do conteúdo a ser ensinado.

    A explicação segue a analogia com o funcionamento dos vidros de uma estufa. Exposta logo no início do tópico que situa a questão da elevação da concentração de gás na atmosfera apresenta informação equivocada ou desatualizada sobre a procedência do CO2: Nos últimos anos o homem tem realizado muito desmatamento e efetuado muitas queimadas. Isso fez aumentar a proporção de CO2 na atmosfera...(p.424). Hoje se credita a ação antrópica papel determinante na emissão de gases de efeito estufa. A explicação é pouco fundamentada e esclarecedora, ficando o assunto como um tópico desarticulado da questão ambiental.

    A ilustração (figura 5) é bem simples e demonstra o efeito de retenção das radiações infravermelhas, não acrescentando maiores esclarecimentos à explicação. Mesmo com a legenda, não se pode considerar a figura como enriquecedora da explicação do texto.

Figura 5: livro Biologia – Volume Único – Coleção Horizontes

    Nas previsões existe um alerta para a possível rapidez da mudança do clima, com a elevação de temperatura podendo comprometer a qualidade de vida dos seres do planeta de modo geral. Não foi identificada nenhuma ação preventiva de forma explicita.

    O enfoque ambiental está presente nas possíveis conseqüências prejudiciais ao ambiente do efeito estufa e na demonstração da preocupação com este fato tanto por parte dos cientistas, quanto dos ambientalistas. Não foi evidenciada nenhuma alusão a atividade humana como fator de interação com o fenômeno efeito estufa.

    Dentro das atividades propostas só foi observada a presença de duas simples perguntas sobre definição e conseqüência do efeito estufa. Não há nenhuma proposição para atividade complementar ou busca de informações fora do livro em questão.


Considerações

    O livro Bio – Volume Único aborda o tema de forma sucinta e pouco abrangente, citando o contexto em que ele se enquadra sem fundamentar conceitos, nem expor uma definição. Não existem propostas de busca de conhecimentos para além do livro didático, ficando o assunto restrito a um texto de apêndice ao final de um capítulo que se propõe a tratar de ecologia, seus princípios e de estrutura de ecossistemas.

    O livro Biologia – Volume Único – Série Novo ensino Médio trata o assunto de forma superficial e desarticulada das possíveis causas e conseqüências do efeito estufa e também ignorando a ação antropogênica no fenômeno. Não aparecem estímulos para aquisição de conhecimentos fora às informações fornecidas pelo livro. O tema aparece na parte de ecologia mas, sem estar adequadamente aprofundado nos contextos em que vem inserido.

    O livro Biologia – Volume Único – Coleção Base trata a mudança do clima de forma abrangente, contemplando além da perspectiva científica, a perspectiva política e econômica atuais, necessária para um melhor entendimento do assunto. Ao abordar o tema com um tópico inteiro dentro de uma unidade que relaciona a natureza com a ação humana, pode-se notar que o autor baseia-se numa concepção articulada de varias faces do conhecimento para sua apresentação.

    O livro Biologia – Volume Único – Coleção Horizontes traz uma visão muito superficial e pouco atualizada do efeito estufa e suas causas. Embora restrito a um pequeno tópico do livro, o assunto está corretamente tratado no que diz respeito às possíveis implicações futuras do aumento e continuidade do fenômeno na Terra. A única referência à ação antrópica acontece de forma equivocada quando são abordadas as queimadas.

    Pode-se dizer que o fenômeno efeito estufa é tratado de forma muito diferente por diferentes autores. Os enfoques apresentam-se divergentes, alguns muito sucintos e com pouca interface com outras áreas do conhecimento. Pode-se considerar que é necessário uma maior uniformidade e atualidade conteúdo para tratar um tema tão relevante para o planeta e a qualidade de vida das futuras gerações.

    Os critérios aqui propostos são um esboço de um trabalho de análise que deve ser levado em conta ao trabalhar com o assunto, bem como pode ser pré-requisito para análises futuras.


Bibliografia

FONSECA, A. Biologia. Volume Único. Coleção Horizontes. IBEP, São Paulo, 2000.

LOPES, S. BIO. Volume Único. Editora Saraiva, São Paulo, 1999.

MERCADANTE, C. e FAVARETTO, J. A. Biologia. Volume Único. Moderna, São Paulo, 1999.

MOHR, A. Análise do Conteúdo de Saúde em Livros Didáticos. Ciência & Educação, v. 6, n. 2, p.89-106, 2000.

KUHN, T. S. A estrutura das revoluções científicas. Perspectiva, São Paulo, 1978.

SANTOS, E. O. Contribuição ao Estudo do Fluxo de Dióxido de Carbono Dentro da Floresta Amazônica. Dissertação de Mestrado Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1999.

Sites pesquisados
www.ipcc.com
www.unfccc.com
 

[1] Cabe esclarecer a utilização do  termo paradigma, que é aqui apresentado, tem um sentido geral e um sentido irrestrito, de acordo com Kuhn (1978). O primeiro foi empregado para designar todo o conjunto de compromissos de pesquisas de uma comunidade científica (constelação de crenças, valores, técnicas partilhados pelos membros de uma comunidade determinada). A este sentido, Kuhn aplicou a expressão “matriz disciplinar”. “Disciplinar” porque se refere a uma posse comum aos praticantes de uma disciplina particular; ‘matriz’ porque é composto de elementos ordenados de várias espécies.
[2] O efeito estufa é um fenômeno essencialmente natural, formados por gases que permitem que a luz do sol penetre na superfície terrestre, mas que bloqueiam a radiação do calor e o impedem de voltar ao espaço. Graças a isso, a temperatura média da superfície do globo é mantida em cerca de 15ºC, criando condições que permitem a existência da vida tal como se conhece.
[3] Os critérios de análise, para ficarem em destaque, foram grafados em maiúsculas.