A CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA TABELA PERIÓDICA
COMO PROPOSTA DE APRENDIZAGEM
 

Ellen Suzi C. L. Constantino
PGPEC – Universidade Federal Rural de Pernambuco
(ellensuzi@bol.com.br).

Micheline C. L. Dias
PGPEC – Universidade Federal Rural de Pernambuco
(mcldias@bol.com.br).

Marcelo B. C. Leão
Departamento de Química – Universidade Federal Rural de Pernambuco
(mbcleao@terra.com.br).

Resumo



Neste trabalho buscou-se utilizar a história da química para auxiliar o ensino da tabela periódica em turmas da 8ª série do ensino fundamental de uma escola da rede privada. A metodologia constou de atividades que envolveram 4 turmas de alunos, onde se utilizou a metodologia tradicional em duas delas e nas outras duas contemplaram o contexto histórico da tabela periódica como ferramenta na mediação do processo de ensino e aprendizagem. Os resultados mostraram que o uso da história como ferramenta de aprendizagem levou a uma aprendizagem mais significativa, uma maior socialização dos alunos e ainda um maior engajamento nas atividades elaboradas.
 


Abstract

This research aimed to use the chemistry history to help the periodic table teaching in 8th year classes of a middle private school. The methodology consisted of activities that involved 4 classrooms, in two classes it was used a traditional methodology and in the others the historical context of the periodic table as a tool in the process of teaching-learning. The results showed a better comprehension for the students in the classrooms which were used the chemistry history, a larger socialization of the students, and they were also more engaged in the elaborated activities.
 

Introdução

 O ensino de ciências tem sofrido muitas mudanças em sua estrutura curricular, influenciado principalmente pelos avanços tecnológicos na sociedade. Em contra partida, percebe-se que os alunos demonstram um desinteresse em relação ao ensino de ciências, decorrendo, com isso, um crescente analfabetismo científico. Precisamos tentar reverter este quadro por meio de propostas inovadores que viabilizem um ensino de ciências contextualizado e voltado para a formação de cidadãos críticos.
 

A História e Filosofia das Ciências (HFC)

O fato da necessidade do professor conhecer as interações sócio-tecnológicas passa por uma discussão do uso da História e Filosofia das Ciências (HFC) no ensino de ciências (MATTHEWS, 1994).Com o uso da HFC o professor pode trabalhar com muito mais facilidade o problema das mudanças políticas, econômicas e sociais que interferem nas descobertas científicas, e quais as resistências e favorecimentos que esses setores tiveram para tais descobertas. Essas reflexões podem favorecer ao professor no que diz respeito a sua perspectiva de atuação, bem como também o seu compromisso como educador, no intuito dos alunos exercerem efetivamente a sua cidadania.
Além disso, o professor deve conhecer as dificuldades que foram encontradas para a construção do conhecimento, no sentido de expor todas essas dificuldades e mostrar-lhes como realmente este conhecimento foi construído, ou seja, a evolução das idéias através das dificuldades porque passaram. O uso da História e Filosofia das Ciências aproxima assim o aluno da ciência, estabelecendo uma visão clara das idéias científicas, e mostrando que assim como ele sente dificuldade no processo de construção do conhecimento, a ciência também teve e têm dificuldades na aquisição de novos conceitos. A ciência, assim como o aluno, progride através da superação de tais dificuldades.
O professor deve ainda, conhecer as metodologias empregadas, isto é, a forma que os cientistas abordam os problemas, porque o critério de validação e aceitação das teorias não são simples, a mesma dificuldade que o referido aluno está tendo para superar conceitos existentes vindo do conhecimento cotidiano, a própria ciência também vive nesse conflito (conflitos esses  com conhecimentos também científicos).
Para o professor deve estar bem claro que a aceitação de uma idéia científica não é uma coisa individual e sim um conjunto de idéias que devem ser aceitas por uma quantidade tal de componentes da comunidade científica que acabe tornando tais idéias hegemônicas. Portanto conhecer esse processo de validação é fundamental, porque além de conhecer as possíveis dificuldades de superação de conceitos torna a ciência sem o estigma positivista da uniformidade.
O uso da HFC no ensino de ciências também pode ser justificado, pelo fato de que conhecer como a ciência progride ou se desenvolve, ajuda a questionar a linearidade da ciência, mostrando os vários caminhos que podem chegar a um mesmo desenvolvimento científico.
 Neste contexto, a História e Filosofia das Ciências (HFC) defende uma metodologia de ensino aprendizagem, que dê ênfase ao contexto social, histórico, filosófico, ético e tecnológico. Através desta perspectiva, o ensino de ciências torna-se mais interessante, mais coerente, motivador, crítico e humano, proporcionando uma melhor compreensão dos conceitos científicos.O uso da história no ensino de ciências permite um conhecimento mais rico do método científico, bem como demostra que a ciência é mutável. Além disso, o professor adquire uma capacidade mais crítica, um conhecimento histórico e filosoficamente mais significativo. Este conhecimento poderá tornar o professor mais independente frente a sua sala. (MATTHEWS, 1994)

A Tabela Periódica

Figura 1. Foto de uma Tabela Periódica (www.eciencia.usp.br/laboratoriovirtual/tabela_periodica_v3p2.html)
 

Dentre os conteúdos de química, o da tabela periódica (figura 1) é um dos que mais apresentam problemas para o aprendizado do aluno. A proposta que esta investigação apresenta concebe a construção da história da tabela periódica como a dimensão básica deste conhecimento e, portanto, necessária de ser contemplada na atividade pedagógica com a química.
 A tabela periódica (Trífonov, 1984) foi construída a partir do aumento das descobertas dos elementos químicos. O fósforo, primeiro elemento a ser descoberto pelo alquimista Henning Band, em 1669, foi o ponto de partida para a construção da tabela periódica. Seguiram-se 200 anos de investigações de modelos para reconhecer as propriedades e desenvolver esquemas de classificação. A primeira classificação dos elementos químicos foi a divisão em metais e não metais. No início do século XIX, John Dalton (figura 2) preparou uma lista de elementos químicos com massas conhecidas em ordem crescente de massa atômica. Vale salientar, que muitas dessas massas, foram corrigidas posteriormente por outros cientistas.
 


Figura 2. Retrato de John Dalton

 Os químicos ao estudarem essa lista, concluíram que ela estava confusa, pois alguns elementos que tinham propriedades químicas semelhantes possuíam massas atômicas muito separadas.
 John W. Boebereiner, em 1829 agrupou os elementos químicos em três (tríades), separados pelas massas atômicas (a massa atômica do elemento central da tríade era a média da massa atômica do primeiro e terceiro membro), mas com propriedades químicas muito semelhantes. Em 1864, John A. R, Newlands, sugeriu um modelo periódico de oitavas (grupos de oito) na ordem crescente de suas massas atômicas, que foi ridicularizado pela analogia com os setes intervalos da escala musical, sendo impedido de ser publicado.
Neste período, não foi encontrada nenhuma regra numérica que pudesse organizar completamente os elementos químicos numa forma consistente, com as propriedades químicas e suas massas atômicas. A base teórica na qual os elementos químicos estão arranjados atualmente era desconhecida naquela época e permaneceu assim por várias décadas.
 


Figura 3. Foto de Dimitri Ivanovich Mendeleev

Entretanto, Dimitri Ivanovich Mendeleev (figura 3), com base na observação química de seus compostos, organizou os elementos na forma da tabela periódica atual, de acordo com a ordem crescente de suas massas atômicas. A vantagem da tabela periódica de Mendeleev sobre as outras, é que esta exibia semelhança, não apenas nas tríades, mas numa rede de relações vertical, horizontal e diagonal. Mendeleev recebeu o prêmio nobel por este trabalho em 1906.


Figura 4. Foto de Henry Moseley

 Em 1913, Henry Moseley (figura 4), deu um passo importante na história da evolução da tabela periódica, quando descobriu que o número de prótons no núcleo de um determinado átomo, do mesmo elemento químico, era sempre o mesmo.
 Com o passar do tempo, os químicos foram melhorando a tabela periódica como as descobertas de novos elementos, bem como com um número mais preciso na massa atômica os existentes, sempre em função dos conceitos originais.
 Glem Seaborg (figura 5), na década de 50 fez a última e maior mudança reconfigurando a tabela periódica, introduzindo a série dos actinídeos abaixo da série dos lantanídeos.
 


Figura 5. Foto de Glem Seaborg

 A classificação periódica marca, portanto o apogeu de uma química centrada nos elementos. É a resposta a um problema específico da química do século XIX e o fim de uma longa história repleta de tentativas e erros.
 

Justificativa

 É por meio da ciência que procuramos organizar o que aprendemos sobre a natureza, buscando explicações simples e concretas dos fenômenos que observamos. Nessa perspectiva, acreditamos que a opção de privilegiar a contextualização histórica da química na classificação dos elementos proporcionará ao aluno a compreensão e a apropriação dos conhecimentos que foram utilizados para a construção da tabela periódica, propiciando assim, um melhor entendimento a respeito da organização atual dos elementos químicos e de suas propriedades.
A tabela periódica é um dos tópicos do ensino de química que mais inquieta os alunos, visto que, na maioria das vezes, são induzidos a memorizar nomes e relações pouco úteis em sua vida cotidiana. O ensino da tabela periódica na realidade em muitas instituições é guiado apenas pelo livro texto e pela ação docente sendo assim, um obstáculo do aprendizado deste assunto. O objetivo desse trabalho é propor a utilização da história da química como um instrumento para que o professor possa fazer a mediação no ensino da tabela periódica. Acreditamos que essa metodologia poderá permitir uma melhor compreensão por parte do aluno, uma vez que a memorização, incentivada por alguns professores não possibilita aos aprendizes a compreensão das propriedades químicas e físicas dos elementos.
 Em suma, a abordagem histórica permite ao aluno perceber que a tabela periódica foi construída pelo homem, logo sujeita a circunstância temporal, social e política; transmitindo uma visão dinâmica, não fechada, não pronta, da ciência nos seus aspectos cultural, científico e biográfico. Vale ressaltar ainda, que visão histórica da tabela periódica permite a compreensão de sua construção a partir de propriedades macroscópicas como, massa, densidade, ponto de ebulição, reatividade, etc.
 

Materiais e métodos

 Neste trabalho utilizou-se quatro turmas. As turmas A e B foram denominadas amostra 1. Nestas turmas foi utilizado o ensino tradicional de transmissão. As turmas C e D, foram chamadas de amostra 2. Esta última será contemplada pela história da ciência como instrumento para o ensino da tabela periódica, envolvendo alunos da 8ª série do Ensino Fundamental II do Colégio Maria Tereza, localizado na cidade do Recife-PE, com faixa etária entre 14 e 15 anos. Na amostra 1 as aulas foram expositivas, utilizando o método tradicional de ensino e na amostra 2 as aulas utilizaram o contexto histórico da tabela periódica como ferramenta na mediação do processo de ensino aprendizagem.
 No primeiro momento, aplicou-se um pré-teste nas turmas envolvidas, objetivando conhecer as idéias prévias que os alunos possuíam a respeito da tabela periódica. Tanto o pré-teste como o pós-teste continham as seguintes questões:
 

1) Qual a idéia que vocês possuem da tabela periódica?
2) Quais os critérios que foram utilizados pelos cientistas para a organização da tabela periódica?
3) Os cientistas que desenvolveram a tabela periódica tinham conhecimento da existência dos prótons, nêutrons e elétrons?
4) Qual a importância da tabela periódica para o seu dia-a-dia?
5) Cite algumas famílias presentes na tabela periódica.
 

 Na amostra 1, o professor utilizou em suas atividades didáticas uma metodologia tradicional, baseado apenas no livro didático e em aulas expositivas.
Diferentemente, na amostra 2, foi trabalhado inicialmente um texto relatando toda a história da organização e classificação dos elementos químicos.
 Em seguida, utilizou-se de um jogo, denominado "Construindo sua tabela periódica", composto de cartões ilustrados (figura 6), contendo informações de propriedades macroscópicas como (massa, densidade, ponto de ebulição, fusão, reações com oxigênio e com o hidrogênio), sem o uso da nomenclatura do elemento. Este jogo foi elaborado em conjunto na disciplina de Tópicos em História da Química, no mestrado de Educação nas Ciências da Universidade Federal Rural de Pernambuco.
 


Figura 6. Representação dos cartões utilizados no jogo
 

Neste jogo, esperou-se que os alunos, a partir dos dados de cada cartão, organizassem os elementos químicos, segundo critérios propostos por eles, sem a preocupação com o modelo atual da tabela periódica.
 


Figura 7. Foto dos alunos montando a tabela periódica.

Os alunos trabalharam em grupo de cinco componentes (figura 7). Cada grupo recebeu um kit contendo: cartolina, cola, hidrocores e os cartões ilustrados para a confecção de sua própria tabela periódica. Tiveram aproximadamente noventa minutos para concluir o trabalho e logo após apresentar os resultados (figura 8) para o grande grupo.


Figura 8. Foto dos alunos apresentando os resultados.

 Em outro momento, no laboratório de informática utilizando o site http://www.furtado.com.br/quimica os alunos agora divididos em dupla (figura 9) e sob orientação dos professores que química e informática, acessaram a tabela interativa para aprofundar seus conhecimentos em relação aos elementos químicos pré escolhidos, nos seguintes aspectos: descoberta, ocorrência, classificação, símbolo químico, número atômico, propriedades físicas, propriedades químicas, usos e aplicações, configurações eletrônicas, segurança em laboratório.


Figura 9. Foto dos alunos utilizando uma tabela periódica interativa no laboratório de informática.
 

Logo após, foi feita a socialização dos diversos saberes em sala de aula. Neste momento, o professor a partir das discussões dos alunos sistematizou o conteúdo.
 Finalizando as atividades didáticas foi aplicado um pós-teste nas duas amostras participantes da pesquisa.

Resultados e discussão

 Os alunos (figura 10) divididos em equipes organizaram os cartões ilustrados dos elementos químicos em tabelas segundo critérios criados por eles.


Figura 10. Foto da organização dos cartões pelos alunos.

Após a análise do material produzido pelos alunos observaram-se quatro critérios de classificação:

1) organização por ponto de fusão
2) organização estado natural
3) organização por ordem crescente de massa atômica
4) organização por ordem crescente de densidade.

Houve uma maior tendência dos alunos em agruparem os cartões ilustrados dos elementos químicos por seu estado natural, e em seguida pela massa atômica. Poucas equipes agruparam pela densidade ou pelo ponto de fusão. Algumas equipes, entretanto, utilizaram ao mesmo tempo dois critérios de classificação. Como por exemplo, estado natural e ordem crescente de massa atômica.
Após as atividades didáticas aplicou-se um pós-teste para comparação com os resultados do pré-teste. Em relação à amostra 2 (gráficos 1 e 2), onde utilizamos a metodologia alternativa, pode-se perceber que ocorreu:

· um notável aumento de 12% para 66% nas respostas certas
· uma considerável diminuição de:
- 25% para 16% nas respostas parcialmente certas;
- 22% para 10% nas erradas;
- 6% para 10% nas indissiocrátricas;
- 35% para 7 % dos alunos que não responderam.
 

Amostra 2

Gráfico 1. Representação dos resultados do pré-teste aplicado nas turmas C e D

 
 
 

Gráfico 2. Representação dos resultados do pós-teste aplicado nas turmas C e D

Por outro lado, na amostra 1 (gráficos 3 e 4), observou-se que:

· as respostas consideradas certas (9%) foram substituídas por um percentual de 30%.
· nas respostas parcialmente certas, ocorreu uma diminuição de 29% para 18%.
· no percentual de alunos que não responderam houve uma queda de 10% (28% para 18%).
· Ocorreu uma redução das respostas indissiocráticas (18%) para 12 %.
· em relação às respostas erradas ocorreu um acréscimo de 16% para 30%.
 

Amostra 1

Gráfico 3. Representação dos resultados do pré-teste aplicado nas turmas A e B


 

Gráfico 4. Representação dos resultados do pós-teste aplicado nas turmas A e B

 Os resultados permitiram observar que o ensino da tabela periódica guiada pelo livro texto e apenas em aulas expositivas é um dos obstáculos ao aprendizado deste assunto. De outra forma, a proposta aplicada a partir de uma metodologia que contempla a história da química para o ensino da tabela periódica tornou a aprendizagem do aluno mais dinâmica, agradável, interativa e interessante. Esta análise pode ser claramente percebida pela considerável melhora nas respostas dos questionários avaliativos.
 

Conclusões

· A inclusão dessa nova metodologia tornou mais ativo e relevante o ensino da tabela periódica, nos participantes dessa investigação, despertando o interesse dos alunos, propiciando situações de investigação e de construção de conhecimento, que nem sempre são criadas em aulas teóricas-expositivas.

· Outro ponto a ser destacado é a socialização escolar. A relação de diálogo, aluno-aluno, professor-aluno, foi favorecida, pois por meio dessas atividades didáticas ocorreu uma maior integração participantes ativos.

· Na amostra 1, verificou-se que houve uma diminuição no número de alunos  que não responderam as perguntas, no entanto, houve um aumento nas respostas erradas onde é provável que grande parte dos alunos não compreenderam o conteúdo estudado. A química é essencialmente uma disciplina abstrata e por isso, se faz necessário trabalhar com atividades didáticas mais diversificadas que contemplem a história. Muitas vezes é difícil ao aluno fazer uma abstração daquilo que o professor pretende ensinar principalmente se o conteúdo está fora de uma contextualização da história da química.

· Na amostra 2, percebeu-se um aumento significativo nas respostas certas, e uma diminuição das incorretas. Vale a pena salientar, que o percentual de alunos que não responderam, diminuiu bastante, acreditando-se assim, que através das atividades aplicadas os alunos foram incentivados a responder as questões.

·  Finalizando, uma outra implicação desse estudo é sugestão aos professores da elaboração de um material didático a ser utilizado pelos alunos, com o objetivo de facilitar a construção de concepções mais adequadas sobre a organização da tabela periódica.

Bibliografia

Matthews, M. R; História, Filosofía y Enseñanza de las Ciencias: la aproximación actual. Enseñanza de las Ciencias, 1994,12(12),255-277.

Trífonov, D. N. y Trífonov, V. D. Como fueron descubiertos los elementos químicos. Editorial MIR. Moscú. 1984.

Extarído do site: http://www.furtado.com.br/quimica

Extarído do site: http://www.eciencia.usp.br/laboratoriovirtual/tabela_periodica_v3p2.html

Extarído do site: http://www.merck.com.br